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17/10/2022
A falta de acesso regular a uma alimentação adequada por grande parte da população brasileira tem sido um dos principais desafios enfrentados pela sociedade ao longo dos últimos anos. O país havia saído do Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU) em 2014, por meio de estratégias de segurança alimentar e nutricional aplicadas desde meados da década de 1990. Mas voltou a figurar no cenário a partir de 2015, obtendo um especial agravamento ao longo da pandemia de Covid-19 que afetou o mundo todo por dois anos a partir de 2020.
Em 2022, o Segundo Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia de Covid-19 no Brasil, apontou que 33,1 milhões de pessoas não têm o que comer — o que representa 14 milhões de novos brasileiros em situação de fome. Conforme o estudo, mais da metade (58,7%) da população brasileira convive com a insegurança alimentar em algum grau: leve, moderado ou grave.
Projetos de lei em tramitação no Senado buscam atenuar esse quadro. É o caso do PL 354/2022, apresentado pelo senador Rogério Carvalho (PT), que institui o chamado Benefício de Erradicação da Fome, no valor de R$ 250, a ser pago a famílias em situação de extrema pobreza, quando houver insegurança alimentar leve, moderada ou grave no país.
Presidente da Comissão de Direitos Humanos (CDH), o senador Humberto Costa (PT) acredita que medidas como essas ajudam a minimizar a situação. Para o parlamentar, é preciso ampliar os recursos destinados às políticas de segurança alimentar e intensificar os programas de transferência de renda já existentes, com aumento dos valores repassados e do número de contemplados:
— Além disso, ações para o crescimento econômico da nação [precisam ser adotadas]. Recursos para empregos, particularmente, na infraestrutura, na construção civil, que geram trabalho qualificado e em curto espaço de tempo.
Ação política
Os dados do Segundo Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar, divulgados em junho, foram coletados entre novembro de 2021 e abril de 2022, por meio de entrevistas em 12.745 domicílios em áreas urbanas e rurais de 577 municípios distribuídos nos 26 estados e no Distrito Federal. Pesquisa anterior, de 2020, mostrava que a fome no Brasil tinha voltado para patamares equivalentes aos de 2004. A piora no cenário econômico, o acirramento das desigualdades sociais e o segundo ano da epidemia do coronavírus agravaram a situação.
Para a senadora Zenaide Maia (Pros), nada é mais preocupante e urgente do que acabar com a fome de milhões de brasileiros. Na avaliação dela, o governo federal desmontou um importante arcabouço de proteção social, tornando necessária a reconstrução das políticas públicas para essa área. Além de um projeto de geração de emprego e renda, Zenaide pondera no sentido de que o país precisa de mais investimento público e de ações para a valorização do salário mínimo como formas de diminuir os números da fome no Brasil.
— Também precisamos voltar a priorizar o financiamento de agricultores familiares e retomar a formação de estoques de alimentos para evitar os preços nas alturas. Investimentos públicos para a geração de emprego e renda e uma política de valorização do salário mínimo, tudo a gente já teve e precisa resgatar, porque são políticas públicas que salvam vidas — defende Zenaide.
Na opinião do senador Fabiano Contarato (PT), o combate à fome é uma medida prioritariamente política, que requer engajamento das autoridades.
— A insegurança alimentar precisa ser combatida com políticas públicas eficientes, integradas e com reforço orçamentário e vontade política de trabalhar com o setor privado, a sociedade civil e governos estaduais e municipais. Temos de devolver dignidade ao povo brasileiro, com emprego, prato de comida na mesa, filhos na escola, esperança de futuro — pontua.
Para o senador Dário Berger (PSB), enfrentar o problema da fome precisa ser a prioridade do governo:
— É fundamental estender a mão para as pessoas que mais precisam, oferecendo políticas públicas humanitárias, gerando oportunidades, fortalecendo programas sociais e de retomada do emprego. Só assim mudaremos essa triste e dura realidade.
Dia Mundial da Alimentação
A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) instituiu 16 de outubro como o Dia Mundial da Alimentação, no intuito de promover uma reflexão mundial sobre o assunto. Em 2009, o Congresso Nacional aprovou a Lei 12.077, que estabelece 16 de outubro como o Dia Nacional da Alimentação. A finalidade é mobilizar o poder público e conscientizar a sociedade brasileira sobre a importância do combate à fome e à desnutrição, bem como autorizar órgãos públicos responsáveis por essas políticas a desenvolverem atividades educativas e de estímulo à participação social. Na data seguinte, 17 de outubro, celebra-se o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza — instituído também pela Assembleia Geral da ONU em 1992.
No dia 19, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) realiza o seminário Dia Mundial da Alimentação — O princípio de não deixar ninguém para trás. A proposta do evento é refletir sobre os avanços, retrocessos e estratégias para atingir os compromissos globais assumidos em 2015 em relação aos Objetivos de desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, de modo a “erradicar a fome, a pobreza, garantir a paz e permitir à população mundial uma vida digna e plena com sustentabilidade para o planeta”.
A programação conta ainda com lançamento do e-book “Receitas de família — incentivando uma alimentação adequada e saudável a partir do consumo de frutas, legumes e verduras: a experiência no território do Distrito Federal”, elaborado por meio da parceria entre o Observatório Brasileiro de Hábitos Alimentares (OBHA) da Fiocruz Brasília, e as secretarias de Saúde (SES/DF) e de Desenvolvimento Social do Distrito Federal (Sedes/DF).
Enquanto organismos internacionais e nacionais tentam estimular passos à frente na luta contra o deficit nutricional, o Brasil recua. Numa análise do consultor legislativo do Senado Henrique Salles Pinto, o panorama da fome no Brasil mostra que o país regrediu a um patamar equivalente ao da década de 1990. De acordo com o especialista, mesmo o fato de sermos o segundo maior exportador de alimentos do mundo no ranking da Organização Mundial do Comércio (OMC) não tem sido suficiente para erradicar o problema no território nacional. Henrique acredita que essa situação poderia ser mudada se não houvesse tanto desperdício de alimentos no país.
— De fato, em todo o território nacional, 39 mil toneladas de comida em condições de serem aproveitadas vão para o lixo diariamente em mercados, feiras, fábricas, restaurantes, quitandas, açougues e fazendas. O número leva em conta dados de vários setores: agricultura, indústria, varejo e serviços. São vários alimentos como iogurtes perto do vencimento, tomates manchados, pães “amanhecidos”, carne esquecida no congelador e milhares de itens que, por diversas razões, acabam descartados. Tamanha quantidade é suficiente para prover três refeições diárias a, aproximadamente, 19 milhões de pessoas — dimensiona Henrique Salles.
Um tema que apresenta relação direta com o combate ao desperdício de alimentos diz respeito às estratégias de estoques de produção. Para Henrique Salles, o estímulo ao armazenamento poderia ser alcançado complementando-se a lei que instituiu o Alimenta Brasil. Isso porque, segundo ele, uma alteração no artigo 39 da Lei 14.284/2021 permitiria à Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), no âmbito das operações do Programa Alimenta Brasil, continuar articulando-se junto a cooperativas e demais organizações formais da agricultura familiar, inclusive com a apresentação de metas de ampliação de seus estoques públicos para o alcance dos objetivos do Alimenta Brasil, nos termos de regulamento. A modificação da lei, no entanto, cabe a senadores e deputados.
Outro assunto frequente nos debates do Congresso, conforme o consultor, refere-se a medidas financeiras para agricultores (principalmente familiares) aumentarem sua produção e destinarem essa produção a pessoas de baixa renda. Ele citou como referências a Lei 11.326/2006, que estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais, e a Lei 14.284/2021, que concede auxílio financeiro aos agricultores familiares brasileiros, de modo a auxiliá-los em suas atividades produtivas.
— Garantir recursos suficientes no Orçamento da União para o referido programa ao longo dos próximos anos deve ser uma das prioridades dos parlamentares brasileiros. Nesse mesmo sentido, a garantia de, no mínimo, R$ 600 mensais às famílias inscritas no Auxílio Brasil é fundamental para reduzir os índices de insegurança alimentar e nutricional no país, lembrando que esse valor está previsto apenas até dezembro de 2022 — alerta o consultor do Senado.
Entre os textos legislativos que tramitam no Senado, há peças como o PL 354/2022, que pretende instituir o Benefício de Erradicação da Fome, no valor de R$ 250, a ser pago a famílias em situação de extrema pobreza, quando houver insegurança alimentar leve, moderada ou grave no país; bem como criar o pagamento da 13ª parcela desse programa, em dezembro de cada ano. Do senador Rogério Carvalho (PT).
Segundo a Nota Técnica de Impacto Orçamentário e Financeiro 3/2022, elaborada pela Consultoria de Orçamentos, Fiscalização e Controle do Senado, o impacto da medida seria de R$ 49,6 bilhões em 2022; de R$ 58,7 bilhões a R$ 61,0 bilhões em 2023; e de R$ 58,7 bilhões a R$ 63,1 bilhões em 2024. Esses números incluem a previsão de uma 13ª parcela desse benefício em dezembro, optando-se pela aplicação — ou não — do índice correspondente ao IPCA projetado do período anterior, de modo a preservar seu valor real. Quanto à 13ª prestação do Programa Auxílio Brasil (exclusive o Benefício de Erradicação da Fome), a estimativa do impacto alcançaria R$ 4 bilhões para 2022; de R$ 4 bilhões a R$ 4,2 bilhões para 2023; e de R$ 4 bilhões a R$ 4,4 bilhões para 2024, a depender da aplicação ou não do índice de correção do valor médio dos benefícios.
Também aguarda seguimento de tramitação na Casa o PLC 104/2017, que institui a Política Nacional de Erradicação da Fome. Já aprovada pela Câmara dos Deputados, a proposta estabelece a função social dos alimentos, que é cumprida quando os processos de produção, beneficiamento, transporte, distribuição, armazenamento, comercialização, exportação, importação ou transformação industrial tenham como resultado o consumo humano de forma justa e solidária.
O texto tem relatoria do senador Alessandro Vieira (PSDB) e será analisado pelas comissões de Assuntos Econômicos (CAE), Direitos Humanos (CDH) e de Agricultura (CRA), antes de ir a Plenário.